segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Gabinete Brasília
Kátia Maranhão
Assessora Imprensa

BRASÍLIA >
Clodovil abala o Congresso
Rafael PaixãoRepórter
Brasília pode não ter mudado, mas a Câmara dos Deputados, quanta diferença! Eleito deputado federal com o slogan «Brasília nunca mais será a mesma», o polêmico estilista e apresentador Clodovil Hernandes (PR-SP), inegavelmente, mexeu com as estruturas da Câmara. Não só pelas polêmicas que protagonizou no início do mandato e pelo frisson que causa quando circula pelos corredores da casa, como também pela reforma que fez no gabinete, transformando-o numa espécime única entre os 513 existentes, e por isso mesmo o mais visitado.Se não fosse pouco, ele apresentou uma proposta de emenda constitucional que prevê nada mais nada menos do que a redução do número de deputados dos atuais 513 para 250. Que heresia! Para fechar, Clodovil promete abalar mais uma vez quando a reforma do seu apartamento funcional em Brasília ficar pronta, o que deve acontecer até o final do mês. A partir daí, ele vai morar na capital federal. Aí, sim, a cidade talvez não seja mais a mesma!
Extremamente simpático e cordato, mas com a língua afiadíssima, Clodovil recebeu o Caderno Brasília em seu gabinete por uma hora. O local de trabalho já chama a atenção de quem chega no 4º andar do anexo IV da Câmara. Ao sair do elevador, já é possível perceber a diferença do seu gabinete. Ao invés da tradicional porta de madeira de todos os outros, o de Clodovil é pintado de verde.O interior, então, é completamente diferente do escritório dos outros parlamentares. O ambiente é muito mais claro, com tons pastéis nos móveis e paredes. O tapete tibetano marrom também chama a atenção. Vários desenhos feitos pelo próprio Clodovil, incluindo um dele com quatro cachorros, dão um visual despojado.
Reforma foi paga por ele
Na sala ocupada pelo deputado, um sofá claro com o brasão da República. Na porta, uma máscara chinesa. Mas o objeto mais inusitado é a escultura de uma cobra naja que sustenta sua mesa de trabalho, apelidada de Marta. Clodovil nega que seja uma referência à desafeta Marta Suplicy, mas, durante a entrevista, fez pesadas críticas à ex-prefeita de São Paulo, também sua ex-colega de televisão na época do programa «TV Mulher».
É bom lembrar que a reforma do gabinete, que custou R$ 200 mil, foi paga com recursos do próprio deputado.Não é à toa que seja o gabinete mais visitado da Câmara. Além do fato de ser um oásis de frescor em relação
aos outros sisudos escritórios parlamentares, Clodovil faz questão de atender todos que o procuram pedindo ajuda. «Tenho muito prazer de ser deputado, porque posso fazer muita benemerência. Todas as portas se abrem para as coisas banais e mais graves. Não deixo ninguém sem atendimento médico. O Brasil é engraçado: faz o SUS, que lembra susto, a pessoa vai pro médico, que faz uma receita e a pessoa não tem dinheiro pra comprar. Para ser bem feito, a pessoa sairia de lá com o remédio, inclusive com atendimento psicológico», defende. Mas a relação de Clodovil com seus pares não é das melhores. Sem aceitar provocação, ele não tem pudores em criticar abertamente seus colegas, inclusive diretamente a eles. Com Aldo Rebelo (PCdoB-SP), ex-presidente da Câmara, por exemplo, ele se decepcionou depois de uma curiosa coincidência. Ao pegar um táxi em São Paulo, descobriu que o motorista havia saído de Alagoas junto com Aldo para a capital paulista.
Deputado não aceita provocações
Clodovil contou a história para o deputado e sugeriu que ele procurasse o taxista para saber se ele estava precisando de ajuda. «Disse a ele: ’você não diz que é de esquerda e é comunista’?. Depois perguntei pro Aldo se ele tinha pensado no que falei e ele nem lembrava e me falou que não ia procurar a pessoa. Aí disse para ele: ’agora já sei quem é você’. Eles agem como se fossem deuses. Se você quer saber quem é o seu seu amigo é só dar poder para ele», diz.Outro que sentiu a sinceridade de Clodovil foi Luiz Sérgio (RJ), que, quando era líder do PT, pediu a sua cassação por ter chamado a deputada Cida Diogo (PT-RJ) de «feia». «Um dia ele me esticou a mão para me cumprimentar e eu retribuí. Aí eu disse: ’Dei a mão porque sou uma pessoa educada, mas o senhor nunca terá meu coração nem minha alma’», relata.Outra vez, um grupo de deputados mais idosos quis provocar Clodovil perguntando, com gestos, como seria ser homossexual. A resposta de Clodovil? «Nenhum dos senhores poderia ser porque são muito feios. E não sei como vocês perguntam isso a uma pessoa que vocês não conhecem», reagiu, não sem antes acusá-los, com outras palavras, de impotentes. «Depois disso, nunca mais eles falaram comigo», se diverte. Clodovil diz ainda que não anda com o bottom que identifica os deputados. «Todos os 500 deputados sabem meu nome e eu não sei o nome de quase ninguém», aponta.
Próxima meta é ser senador
O Senado que se cuide! Clodovil diz que seu projeto para 2010 é disputar uma cadeira de senador. «Já consegui várias coisas boas na Câmara e conseguirei melhores, porque quero ir pro Senado. Lá não precisa ficar batendo boca com ninguém e tem menos parlamentares. Como já tenho 72 anos, já tenho direito de ir para o Senado», brinca.Mesmo tendo sido o terceiro deputado mais votado em São Paulo, com 494 mil votos, talvez não seja fácil para ele conseguir a candidatura, pelas palavras pouco amistosas em relação aos partidos. «Minha candidatura depende dessa coisa horrorosa chamada partido. Nada que é partido é bom. Meu partido político se chama Brasil. Em Ubatuba, apoiei um candidato do PT, que não é um partido, mas uma seita. Eles já botaram várias velhinhas para me desacatar. Se eu respondesse poderiam usar contra mim», lamenta.
Aliás, Clodovil corre o risco de perder o mandato porque mudou do PTC, por qual foi eleito, pelo PR. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que o mandato pertence ao partido e não ao deputado eleito. O PTC recorreu ao TSE para rever o mandato de Clodovil, mas o caso ainda não foi julgado. «Se fizerem alguma coisa, eu vou fazer um rebu. Só faltava me convencerem que os votos que eu tive foram por causa do PTC. O PTC teve 754 mil votos no Brasil inteiro. Eu tive quase 500 mil votos sozinho em São Paulo», reclama. Ele não gosta de fazer avaliações políticas, mas não deixa de criticar o Governo Luiz Inácio Lula da Silva. «É um Governo comprometido com o poder econômico mundial e abriu as pernas para o bancos. É um Governo vingativo», aponta. Um dos alvos prediletos de Clodovil é Marta Suplicy, com quem dividiu a apresentação do programa «TV Mulher». Imitando o modo de falar da ex-prefeita, ele recorda: «Conheci a Marta quando ela foi fazer vestido de noiva comigo, mas era caro e ela não fez. Nunca gostei dela. Sexóloga não vai para a televisão. O palavreado não combina com a TV, tanto que nunca mais teve outra sexóloga na televisão depois dela. Como que você vai orientar sexualmente as pessoas na TV?. A Marta me dá nojo, que é pior do que ódio», critica.
Deputado critica nível da Câmara
A proposta de Clodovil que chamou mais a atenção é a que reduz o número de deputados federais de 513 para 250. A matéria conseguiu as assinaturas necessárias para tramitar, mas Clodovil sabe que é difícil aprová-la. «Eles pensam que vão me enganar, mas não sou débil. Foram simpáticos e assinaram a PEC, mas depois votam contra, porque são muito unidos. O que eles não sabem é que vou colocar o povo contra eles», revela.
A idéia é convocar um plebiscito para que a população decida se apóia a diminuição do número de deputados. «É preciso aumentar o nível da Câmara. Os deputados discursam para um plenário vazio. É uma vergonha. Elas falam para angariar votos. Você tem que ser eleito por capacidade e não por falcatruas. Não dá para comparar a minha instrução com a maioria dos deputados. Eles não sabem falar. É ’nós vai, nós foi’. É um pavor», condena. Mesmo participando da vida política de Ubatuba, onde mora atualmente, Clodovil não pensa em se candidatar a prefeito. «Deus me livre! Cargo no Executivo é muito burocrático. Sou mais do Parlamento, onde posso falar. Além disso, não posso viver com o salário de prefeito, senão vou roubar. Preciso de dinheiro para viver. Eu gasto muito! Sou perdulário. Não vou morrer rico, mas em compensação o que as pessoas vão brigar com as coisas que vou deixar...», diz.
Candidatura surgiu de «chamamento»
O deputado tem uma explicação metafísica para sua candidatura a deputado. «Vim para cá por uma força superior, que chamo de Universo. Um dia fui avisado de noite que seria deputado. Na mesma semana, fui chamado por uma pessoa para ser candidato. O chamamento foi no dia que soube do câncer de próstata. Quando dormi, tive um insight. Tenho confiança no meu público da televisão, que são senhoras», conta. Assim que foi eleito, fez uma visita surpresa à Câmara. «Saí assustado porque todos queriam me ver. Foi um tumulto», lembra. Clodovil, que já foi católico, decepcionou-se com a religião. «A Igreja Católica foi construída por homossexuais e hoje critica. Ninguém é aquilo que quer ser, a gente é a dignidade que dá na vida. A Inquisição matou mais que Hitler. Minha religião é minha própria vida», desabafa. No entanto, ele ressalta que ainda reza o «Pai Nosso» por considerá-la uma «oração lindíssima».
Deputado vai morar na cidade
«Vai ser um acontecimento!». Assim Clodovil define como ficará o apartamento funcional que ocupa na Asa Norte, que está em reforma, prevista para acabar até o final deste mês. O deputado resolveu morar em Brasília definitivamente, apesar de ter uma casa em Ubatuba (SP) que já saiu em várias revistas especializadas. O objetivo é aproveitar melhor o tempo e fazer um trabalho melhor na Câmara. Apesar de ser um dos poucos parlamentares que decidiram morar na capital, já que a maioria fica aqui apenas entre terça e quinta, Clodovil tem várias críticas à cidade. «Não gosto de Brasília. Os brasilienses não têm nada a ver com os estrangeiros que vilipendiam a cidade, mamam na vaca profana e depois vão embora, mas os brasilienses permitem. São muito medrosos, têm medo de perder o emprego e esquecem de coisas importantíssimas, que é o lado cultural, o lado de convívio, que aqui são complicados. Todos os prédios públicos estão caindo aos pedaços e pichados. Falta ao brasiliense exigir coisas», considera.Mas a cidade também recebe elogios. «Brasília foi vista magicamente. Acredito que Dom Bosco foi uma pessoa iluminada. Se ele previu isso tem alguma coisa de mágica aqui. As árvores do cerrado são lindas, retorcidas, fortes, resistem ao clima. Aqui tem os mais lindos flamboyants, acácias amarelas e ipês», derrete-se. Em Brasília, freqüenta apenas restaurantes. O seu preferido é o Alice. A idéia do deputado é que o primeiro jantar no apartamento reformado seja com quatro ministras que admira: Dilma Rousseff (Casa Civil), Nancy Andrighi (Superior Tribunal de Justiça), Ellen Gracie e Carmem Lúcia, ambas do Supremo Tribunal Federal. «Seria muito engraçado. Adoro a Dilma. Ela pega no meu queixo e me chama de ’fofinho’. Ela é muito querida», comenta. A chefe da Casa Civil já tem um voto garantido caso seja candidata à sucessão de Lula. «Votaria nela apesar do partido. Ela disse que está no PT, mas continua sendo a Dilma, e que passa pelos lugares sendo ela mesma. Gosto de pessoas assim. Gente com colhão é minha cara», elogia.
Para ele, TV é «anticristo»
Mesmo tendo ficado conhecido no Brasil inteiro por causa da televisão, hoje Clodovil chama o veículo de «anticristo», assim como a internet. «A TV é realmente uma grande poluidora da alma humana. Eu fazia TV para a sala, para mulheres de família. Hoje em dia, a televisão é feita para privada, para a prostituição, para famílias desonradas. A hora que a família se reúne é nas refeições e é nessas horas que os telejornais são piores: crimes, assassinatos, imoralidade», ataca. As últimas experiências na TV não foram boas. Ele ficou pouco tempo na Band e na curta existência da TV JB (que voltou a ser CNT), com direito a disputas judiciais. Mas ele teve outras polêmicas no passado. «Quem me mandou embora injustamente da Manchete foi o Ulysses Guimarães, porque perguntei para um deputado se a Constituinte era uma Prostituinte. Ulysses ligou falando: ’Manda esse viado embora’», diz, imitando a voz do ex-deputado já falecido. Clodovil também se desiludiu com a moda, no início dos anos 90. «Não tenho fascínio para vestir as mulheres. A mulher de hoje é muito vulgar e a moda ficou tão ordinária. Não acompanho desfiles. Abandonei a moda quando meus vestidos custavam US$ 150 mil dólares», lembra. Mas ele continua desenhando muito.
«Não vou de cadeira de rodas»
Nos últimos dois anos, o deputado, que está com 72 anos, passou por problemas de saúde. Primeiro foi o câncer de próstata, que venceu sem precisar de quimioterapia. O caso o inspirou a apresentar um projeto que prevê acompanhamento psicológico a quem sofre da doença. Depois, teve um acidente vascular cerebral (AVC) em função da sua hipertensão. «O médico queria me levar numa cadeira de rodas. Eu disse: ’Não vou’. Tinha uma ambulância na porta do avião e eu falei: ’estou morto por acaso?’. No hospital, o médico disse que iria passar vergonha, porque eu o estava desmoralizando como médico: ’Você não fez absolutamente nada, ginástica, exercício, e em três dias já está curado’», relata.
Por fim, quando foi corrigir uma cirurgia abdominal, teve uma embolia pulmonar. «Era um coágulo pequeno e mole. Se fosse duro e maciço, teria entupido a aorta e eu teria morrido», assinala. Hoje, Clodovil está bem de saúde e não aparenta a idade que tem.

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